Fui uma pessoa de forte formação católica. Apesar de não mais acreditar na existência de Deus e de não ser mais um católico, grande parte dos meus valores vieram desta formação cristã. Os valores que eu respeito são valores à vida e também valores humanistas: amor ao próximo, não violência, caridade, bondade, perdão, compaixão e respeito à vida.
Minha religião é a Humanidade em busca da Paz .
Este último valor para mim é o maior de todos: o respeito à vida, principalmente o respeito à vida humana. O respeito à vida é o respeito à vida em sua plenitude. Para uma vida ser plena, ela necessita minimamente de condições básicas de sobrevivência, mas também necessita de uma condição tão importante quanto às básicas: dignidade. A dignidade de uma vida reflete a capacidade dela ser respeitada como uma individualidade soberana, desde o seu início até o seu fim. Para uma vida ser plena e digna é preciso que todos seus direitos sejam respeitados e válidos e que o princípio de igualdade seja reconhecido.
Isto colocado, quero afirmar que a legalização do aborto, diferentemente do que muitos querem fazer crer, não vai contra o respeito à vida humana, mas ao seu favor. Para provar esta afirmação basta ler as estatísticas relativas ao aborto clandestino e mortes maternas. O aborto é a terceira causa de mortes maternas no Brasil. Neste contexto é importante que as pessoas entendam corretamente o que é aborto. De acordo com a Organização Mundial da Saúde é considerado aborto o produto da interrupção de uma gravidez quando ocorre até a 22 (vigésima segunda) semana completa de gestação, 154 dias, e com produto da concepção pesando até 500gr. Depois deste período, é considerado parto prematuro
A legalização do aborto e o aborto em si não são a mesma coisa. A legalização do aborto é reconhecer o direito primordial e soberano da mulher em decidir uma questão que se refere ao seu próprio corpo. Apesar de ser a favor da legalização do aborto, em grande parte dos casos eu seria contra a sua realização, mas nunca deixaria de respeitar o direito da mulher tomar a decisão final e nem me precipitaria em ter uma posição inflexível sobre um assunto tão delicado e que envolve tantas questões e fatores. Esta é uma decisão pessoal, que não cabe a ninguém mais, além da própria mulher, seja governo, partidos ou muito menos ainda religiões. Vivemos em um estado laico, somos livres para professar ou não professar fé no deus que quisermos, portanto, não há religião que possa por direito legislar sobre este tema. Cabe à mulher decidir se quer levar uma gravidez a cabo e ainda se deseja ser mãe. Cabe ao governo proporcionar condições em que a gravidez não ocorra quando não planejada, através de educação sexual, planejamento familiar. Cabe ao governo proporcionar segurança para as mulheres e reprimir a violência contra as mulheres, para que não ocorram estupros e gravidez decorrente de estupros. Cabe ao governo garantir acesso à saúde para a mulher nos casos extremos.
A legalização do aborto também não significa que qualquer aborto será legal, a defesa da legalização do aborto pelas feministas não é indiscriminada. Ela baseia-se na proposta de projeto de lei que legaliza o aborto no Brasil, resultante do trabalho da Comissão Tripartite, elaborado, sob coordenação da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres (SPM). Esta Comissão foi instalada pelo Governo Federal para responder à deliberação da I Conferência Nacional de Políticas para Mulheres (CNPM), deliberação esta que foi reafirmada na II CNPM, eventos que juntos reuniram mais de 200 mil mulheres.
De acordo com esta proposta, o aborto será legal se realizado sempre por livre decisão da mulher e nas seguintes condições:
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realizado até a 12ª semana de gestação (quando o feto ainda não possui atividade cerebral);
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realizado até a 20ª semana de gravidez, quando a gravidez decorre de violência sexual;
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realizado a qualquer momento, em casos de grave risco para a vida da mulher gestante.
Jornal A Voz de Araxá.